O aborto tomou conta do horário eleitoral e ao invés de os candidatos à presidência discutirem o caos penitenciário e políticas anti-drogas, prendem-se a discutir um crime que nem de perto é um dos responsáveis pela lotação de processos nas varas criminais; vale dizer, os processos de aborto são raríssimos e dificilmente você encontrará um advogado criminalista que já tenha feito um júri desse delito.
Sem pretendermos adentrar em discussões morais sobre o aborto - se ele é certo ou errado, tentaremos discutir, tão-somente, seus aspectos criminológicos. Assim, antes de qualquer consideração sobre a legalização ou manutenção do aborto, devemos observar como é a aplicada a legislação em vigor (arts. 124 a 128 do CP).
Como foi dito no começo e é facilmente observável, os júris pela prática de aborto são raros a ponto de muitos alunos de Direito caírem no equívoco de pensar que só casos de homicídio vão a julgamento popular e isso ocorre porque a/o abortante só é indiciada e processada quando a prática abortiva dá errado.
O que ocorre, em síntese, é: a gestante tenta por seus próprios meios abortar (seja pelas "técnicas" caseiras, ingerindo remédios abortivos facilmente adquiríveis no Paraguai ou por "parteiras") e quando, conseguindo ou não levar a cabo o aborto, tem efeitos colaterais graves, como hemorragias, vai ao hospital de onde é comunicado o ocorrido às autoridades, o que gerará o processo. Assim, resta à mulher o seguinte dilema: ir ao hospital e responder a processo criminal ou ocultar ao máximo os efeitos colaterais colando em risco sua própria vida, o que acontece no mais das vezes.
O que ocorre, em síntese, é: a gestante tenta por seus próprios meios abortar (seja pelas "técnicas" caseiras, ingerindo remédios abortivos facilmente adquiríveis no Paraguai ou por "parteiras") e quando, conseguindo ou não levar a cabo o aborto, tem efeitos colaterais graves, como hemorragias, vai ao hospital de onde é comunicado o ocorrido às autoridades, o que gerará o processo. Assim, resta à mulher o seguinte dilema: ir ao hospital e responder a processo criminal ou ocultar ao máximo os efeitos colaterais colando em risco sua própria vida, o que acontece no mais das vezes.
Podemos então constatar o seguinte fato: a legislação atual não coíbe o aborto, apenas induz à ocultação de sua prática. E é justamente na "ocultação" que entra o aspecto social do delito: as mulheres de classe social mais baixa por não terem dinheiro para acessar os meios abortivos mais eficazes ("clínicas" abortivas, dinheiro para comprar remédios abortivos ou corromper médicos e direção de hospitais) são as que mais "erram" por terem que usar métodos caseiros e, por isso mesmo, acabam sendo praticamente as únicas a caírem no sistema penal.
Não se pode reduzir a questão do aborto a apenas uma questão moral/eleitoral como se só a manutenção/extinção do crime no Código Penal bastasse.
Restam, pois, ao Estado, ao escolher manter a criminalização ou legalizar, duas opções: 1- reconhecer sua ineficácia em coibir o aborto e legalizá-lo por uma questão de saúde pública, evitando continuar punindo apenas as abortantes que têm sua integridade física seriamente abalada com a prática porque "erraram" e acabaram tendo que procurar um hospital ou; 2- manter a criminalização, devendo, neste caso, aprimorar os meios de repressão para que a punição do aborto se democratiza, abrangendo além das que obtém pleno êxito na prática delitiva, as abortantes das classes altas, o que, no Brasil de hoje, beira a utopia.
Como a maioria dos crimes, só se paga se te pegarem...
ResponderExcluirEu estava falando sobre estas duas opções agora mesmo aqui em casa...eu não voto na Dilma, mas lamento muito que o único ataque que representou prejuízo significativo para sua candidatura tenha sido referente à questão do aborto. Já é passada a hora de se estabelecer uma discussão focada em resultados a respeito do aborto: o Estado vai continuar a ignorar o que vem acontecendo ou vai enfim dar uma resposta, seja legalizando o aborto ou aumentando sua repressão?
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